Washington DC 09/04/2025 Presidente Donald Trump durante cerimônia de assinaturas no salão Oval da Casa Branca foto Daniel Torok/White House...
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Washington DC 09/04/2025 Presidente Donald Trump durante cerimônia de assinaturas no salão Oval da Casa Branca foto Daniel Torok/White House |
A escalada de Trump, a resposta da China e a desorganização do sistema econômico mundial
Por Fernando Horta*
A decisão de Donald Trump de elevar as tarifas sobre produtos chineses para 125%, anunciada em 9 de abril de 2025, desencadeou uma crise que ameaça desmantelar o sistema econômico liberal. Em resposta, a China intensifica esforços para substituir o dólar por um sistema de pagamentos em yuan, desafiando a hegemonia financeira dos EUA. Para o historiador Fernando Horta, essas ações revelam um mundo em "tempo velocíssimo", com risco de inflação, recessão e até conflito militar, enquanto países como o Brasil perdem oportunidades por falta de agilidade.
Trump e a Ilusão de Resiliência Americana
Trump aposta na resiliência da economia americana, acreditando que ela pode substituir importações chinesas e manter o mercado interno intacto. Horta, porém, considera essa visão ultrapassada. Ele compara a situação ao pós-Segunda Guerra, quando os EUA supriram a Europa com agilidade, financiando reconstruções com crédito. Hoje, a indústria americana não tem a mesma capacidade. "Se a demanda por produtos como pratos ou roupas não for atendida, os preços vão disparar, gerando inflação", alerta Horta. Ele prevê que, em 15 dias, supermercados americanos podem enfrentar desabastecimento, pressionando a população e erodindo o apoio a Trump.
O presidente também confia que seus eleitores aceitarão pagar mais por bens essenciais, como lápis ou lâmpadas, em nome de uma "América grande de novo". Horta questiona essa lógica, apontando que o aumento de custos reduzirá o bem-estar, frustrando até os apoiadores de Trump. Ele cita o exemplo de empresários americanos, como o dono da rede Papa John’s, que, apesar de pró-Trump, sofrerá com a queda na demanda causada pela recessão iminente.
China: Planejamento contra o Livre Mercado
A China, por sua vez, responde com uma estratégia planejada. Além de elevar tarifas sobre produtos americanos para 84%, Pequim está implementando um sistema de pagamentos em yuan, contornando o Swift e o dólar. Horta destaca que a China aposta na sua capacidade produtiva — única no mundo a abranger todos os 155 subsetores da OMC — para redirecionar exportações a outros mercados. Navios chineses, antes destinados aos EUA, já negociam com países da América do Sul, minimizando perdas.
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11/04/2025. O presidente do Governo, Pedro Sánchez, e o presidente da República Popular da China, Xi Jinping. Foto: Fernando Calvo / La Moncloa |
Para Horta, a economia planejada chinesa é mais apta a lidar com rupturas rápidas, como as causadas pelas tarifas de Trump, do que o livre mercado americano. "A China acredita que pode sair dessa guerra tarifária em melhor condição", diz. A escalada de 34% para 125% em 48 horas, segundo ele, é insustentável para qualquer economia de mercado, mas a China, com controles centralizados e tecnologia, tem vantagem.
O Dólar e o Fim da Ordem Liberal
O dólar, pilar da ordem liberal, está no centro do embate. Trump usa sua força como reserva de valor para pressionar adversários, ameaçando tratar a criação de moedas alternativas, como uma proposta pelos BRICS, como "ato de guerra". Horta explica que o dólar facilita o comércio global, mas a China busca quebrar essa dependência, embora o yuan ainda não inspire a mesma confiança.
A longo prazo, Horta prevê um dólar enfraquecido. A ruptura das cadeias de valor globais, que pode levar 4 a 5 anos para se reorganizar, reduzirá a influência americana. "Os EUA vão aceitar uma espiral de crises, com inflação e menos bem-estar?", questiona. Ele teme que, diante da perda de protagonismo, Trump opte por um confronto militar, um risco agravado pelo arsenal nuclear de ambos os lados.
O Brasil e a Inação
Para o Brasil, Horta vê oportunidades desperdiçadas. Ele sugere que o governo deveria mapear produtos afetados pelas tarifas e incentivar indústrias, como as têxteis, a suprir o mercado americano. Linhas de crédito via BNDES ou Banco do Brasil poderiam alavancar exportações, mas a lentidão do governo Lula frustra essas possibilidades. "Se o companheiro Zé Geraldo anunciasse isso amanhã, faria uma live elogiando", ironiza Horta, referindo-se a um líder político fictício.
Do lado chinês, o Brasil poderia negociar tecnologia, como fábricas de semicondutores ou energia solar, em troca de absorver excedentes chineses. No entanto, Horta lamenta o "imobilismo" das elites e do governo, que não definem um lado na disputa. "No Rio Grande do Sul, aprendi: numa briga, escolha um lado, ou apanha dos dois", diz. Sem ação, o Brasil enfrentará inflação, pressionando o arcabouço fiscal e a Petrobras, enquanto perde chances de desenvolvimento.
Tsunami Global e Fascismo
Horta concorda com um seguidor que prevê um "tsunami" econômico. A relocalização de fluxos comerciais levará anos, e empresas brasileiras dependentes de insumos importados devem revisar estoques para evitar colapsos. Ele alerta que a promessa de Trump — uma América próspera — exige sacrifícios imediatos, como desemprego e inflação, típicos do fascismo. "O futuro fascista nunca chega", afirma, prevendo que a frustração alimentará ódio contra bodes expiatórios, como a China, até a população se revoltar.
A ordem liberal, baseada no livre mercado, está em xeque. Horta critica sua hierarquia, que condenava países como o Brasil a papéis subalternos. A China, ao rejeitar esse modelo, abriu espaço para outros seguirem. No entanto, sem agilidade, o Brasil ficará com os prejuízos de um sistema em colapso, enquanto Trump e Xi Jinping jogam um pôquer de alto risco, com o mundo como aposta.
Futuro da Ordem Econômica
A guerra tarifária entre Trump e a China está destruindo a ordem econômica liberal, com impactos que vão de desabastecimento a tensões geopolíticas. A impulsividade americana contrasta com o planejamento chinês, que desafia o dólar e redesenha o comércio global. Para Horta, os EUA caminham para a recessão, enquanto a China ganha terreno. O Brasil, preso ao imobilismo, perde chances de lucrar com a crise. Se a escalada continuar, o risco de um conflito maior paira sobre um mundo já fragmentado.
*Fernando Horta é historiador graduado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, mestre e doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília. Durante seu doutorado, foi selecionado pela Fulbright para um período na Josef Korbel School of International Studies, na Universidade de Denver, Colorado. Especialista em História da Ciência, Epistemologia, Teoria da História e Relações Internacionais, Horta foca em temas como política internacional, Guerra Fria, Conselho de Segurança, realismo e bipolaridade.
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