Como o tarifaço de Trump pode ajudar Lula a conter a alta de juros no Brasil

Tarifaço de Trump desacelera economia global e pode ajudar Lula a conter alta de juros no Brasil, abrindo espaço para crescimento, diz mercado.

O presidente dos EUA Donald Trump aplaude o presidente Lula por seu esforço em conter os juros no Brasil — Fotos: Daniel Torok/White House e Marcelo Hide/Fotospublicas

Brasil de Lula pode sair ganhando com a desestabilização (desaceleração, recessão e incerteza) criada pelo governo americano na economia mundial 

O chamado “tarifaço” promovido pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, pode, inesperadamente, abrir uma janela de oportunidade para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva frear o ciclo de alta de juros no Brasil. A avaliação, que ganha força entre analistas do mercado financeiro e de política monetária, aponta que a imprevisibilidade gerada pelas medidas protecionistas de Trump está cristalizando um cenário de desaceleração econômica global — algo que, paradoxalmente, pode aliviar a pressão sobre o Banco Central do Brasil.

Segundo especialistas, a incerteza provocada pelas tarifas americanas, que chegaram a incluir uma sobretaxa de 125% sobre produtos chineses antes de um recuo parcial para 10% global, já levou ao adiamento de grandes investimentos mundo afora. “Ninguém sabe qual regra vai valer amanhã. Essa imprevisibilidade desacelera a economia global, e, como dizem, incerteza é mais eficaz que juros altos para conter o ritmo econômico”, explica um analista ligado à Febraban. Essa percepção transforma o que antes era visto como um risco remoto — uma recessão global — em uma possibilidade concreta.

No Brasil, o impacto pode ser direto na política monetária. Desde que assumiu, Lula tem criticado a taxa Selic, que, apesar de um breve recuo, voltou a subir para conter pressões inflacionárias. Agora, com a economia global desacelerando, o Comitê de Política Monetária (Copom) pode encontrar espaço para pausar ou até reverter a trajetória de alta dos juros. Um comunicado do Copom de janeiro de 2025 já destacava que o “ambiente externo desafiador”, especialmente nos EUA, seria determinante para decisões de política monetária. O texto mencionava a possibilidade de uma desaceleração global impactar a inflação, cenário que, à época, foi subestimado pelo mercado, mas que agora se confirma.

A desordem gerada por Trump também tem implicações geopolíticas que podem favorecer o Brasil. A aproximação entre China e Europa, impulsionada pela necessidade de contrabalançar as políticas americanas, pode beneficiar setores brasileiros alinhados à agenda ambiental, como energias renováveis. “A China, sem petróleo, aposta na eletrificação. Isso alinha interesses com países europeus e pode abrir mercados para o Brasil”, aponta uma fonte do mercado.

Além disso, a tensão entre Trump e o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, agrava o quadro. As políticas de Trump, que estimulam a inflação americana em um contexto de pleno emprego e restrição à imigração, dificultam o controle inflacionário nos EUA, o que pode limitar pressões sobre economias emergentes como o Brasil.

Para Lula, que enfrenta resistência doméstica para acelerar o crescimento econômico, o cenário externo pode ser uma oportunidade de ouro. Se o Banco Central optar por estabilizar ou reduzir os juros, o governo ganhará fôlego para avançar sua agenda de investimentos sem o peso de uma política monetária restritiva. Assim, ironicamente, as medidas erráticas de Trump podem se tornar um trunfo político para o presidente brasileiro.